Vitrines Da Vida

A mulher-do-padre

Efigênia passava boa parte do dia dentro da igreja, mirada pelos olhos emblemáticos dos santos, lá estava ela, fingindo rezar.
Quando o padre surgia seus olhos flamejavam e o coração desfechava. Morava num vilarejo. A população toda se conhecia, pudera cidade pequena.
Quando o ex-padre já velho morreu, Jardel veio assumir seu lugar, era um homem formoso e nem a batina conseguia esconder sua beleza, aparentava ter uns trinta anos. Pele café-com-leite, olhos vivos e dóceis, corpo bonito, mãos grandes.
As moças da região imaginavam tantas coisas.
“Se apaixonar por um padre, você vira mula-sem-cabeça” – alertava as anciãs.
Mas Efigênia não se debelou e apaixonou-se. Tinha dezoito anos, conservava a pureza. Cabelos com os fios dourados, boca sensual, pele bege, abundantemente bem cuidada. Moça cheia de vaidade. Em segredo passava até a madrugada na internet estudando maneiras de seduzir e realizar um homem. Aprendera tanto sobre sexo. Tornou-se uma profissional.
Jardel entendeu a intenção daquela atraente jovem.
Certa tarde não resistiram.
Primeiro um beijo.
Segundos depois os corpos se perdiam um no outro, ali mesmo no chão da igreja, mirados pelos santos de gesso.
E toda tarde o ato se repetia exaustivamente. O padre enlouquecia de prazer. Era sem explicação o que aquela garota fazia.
“É nosso segredo” – dizia ainda dentro dela.
“ Sim, meu amor, meu homem, meu macho, eu te amo – e se oferecia com fervor.
As beatas da cidade perceberam algo estranho e sabidamente averiguavam.
Sempre que Efigênia passava, rezavam baixinho:
“A mulher do padre
Não ouve missa
Nem atrás dela.
Há quem fique …
Como isso é verdade,
assa o ovo
e a linha fica…”
Forma que acreditavam descobrir se era a mulher do padre. Segundo a lenda a mulher que mantivesse relações amorosas com um padre, em castigo tornaria-se mula-sem-cabeça.
E a cidade toda passou a tomar cuidado com aquela moça. Temiam as noites de quinta-feira para sexta-feira, nesse dias ninguém se atrevia a sair até o terceiro cantar do galo. Ah! Nem passavam correndo em frente uma cruz a meia-noite.
Povo do interior é muito supersticioso.
“Lá vai a burrinha do padre” – dizia as adolescentes maldosas e impregnadas de inveja, pois ansiavam saber o que tinha por debaixo da batina daquele belo homem.
Porém Efigênia não estava nem ai. Sabia que isso tudo era asneira do povo antigo. Jamais acreditaria em tal absurdo.
Aos domingos nas tradicionais missas, ao entrar na igreja causava um burburinho. Ninguém sequer escutava o sacerdote e seus sermões.
Esse mistério atormentou aquela comunidade por anos, no entanto ninguém nunca vira ou provara nada, tudo era simplesmente um rumor.
E o tempo foi passando.
Efigênia tornou-se uma fiel da igreja e passou a cuidar da casa.
Como pagamento recebia o ato sexual com o padre.
Tornou-se uma beata respeitada.
Tornou-se, confidencialmente, inteiramente a mulher-do-padre.

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