Vitrines Da Vida

Ele se perdeu…

Estava atrasado demais, alguém já me esperava para mais uma estressante reunião. Entre um passo largo e outro, atendi diversas vezes o celular, e por distração e pressa sequer observei ao redor, como de costume.
Ouvi alguém gritar meu nome. De relance, me deparei com um colega de longa data. Ao fitá-lo me surpreendi com sua aparência devastada…
_ Ei, sumido depois que virou estrela, nem liga mais para os amigos! – disse sem cerimônia.
_ Estou ai mesmo, trabalhando demais! – respondi com receio, pois ele estava tão, mas tão defasado, que dava até medo.
Há sete anos atrás, quando o conheci era um jovem bonito, próximo a completar vinte anos, corpo atlético. Tinha uma beleza que não passava despercebida. As garotas disputam sua atenção e iam pra cama com ele sem pensar duas vezes.
Tinha um olhar brilhante…
Exibia  um sorriso cativante.
Seu rosto dotado de perfeição.
No entanto, sempre andara perdido nos sonhos…
Filho criado somente pela mãe, têm mais três irmãos, sendo todos de pais diferentes. Da  genitora tinha o aval para o que era certo, e também o que era errado. Tinha extrema proteção. Acredito que não seja essa proteção a responsável pela decadência que se encontra, agora diante de mim.
Bem magro, a barba por fazer, mas não por uma questão de ser moda e sim desleixo. Os dentes amarelados, a boca seca, a pele desidratada, um cheiro desagradável.
Conversamos mais ou menos cinco minutos.
_ O que tem feito? – questionei.
_ Nada. Eu estava no Rio trabalhando como garçom, fui despedido e voltei para cá.
_ Hum… e com essa crise esta complicado emprego… – tentei falar algo, pois nem palavras eu tinha.
Ele comentou um pouco sobre a crise do país, afinal sempre fora um cara inteligente.
_ Você tá usando crack? – fui direto na pergunta.
_ Claro, você sabe que há tempos fumo.
Admitiu sem aquele brilho no olhar de quando o conheci.
Pediu-me para ajudá-lo arrumar um emprego, deixou o  número do celular.
_ É da minha mãe – ressaltou – vou esperar você me ligar.
Despedimos.
A partir daí meus passos tornaram-se mais lentos. No meu pensamento tantas perguntas sem respostas.
Ele era um jovem que tinha tudo para se dar bem na vida.
Pensei com imensa tristeza…
Embora fosse na verdade somente um colega… fui atingido pela realidade. A realidade de saber que na nossa caminhada tantas pessoas que passaram por nós, se perderam…
Perderam-se pelos gritos de socorros ignorados.
Perderam-se… simplesmente se perderam…
Perderam-se nas drogas e principalmente no submundo do crack – a droga que mais vicia e mais mata atualmente, seja por seu uso ou suas consequências.
Espero rever este colega outra vez…
Espero que não seja num esquife.

1 COMENTÁRIOS

Deixe um comentário para Monica Cerceau Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.