Vitrines Da Vida

O amanhã será melhor…

Ela chegou com pressa e foi logo perguntando:
__ Que horas sai o próximo ônibus? – sua voz era tão irritante, seu corpo ocupava espaço duplo, com as nádegas exageradas, ao esbarrar em alguém o jogava para o lado. Força do peso. Necessidade de espaço.
Além disso, era feia demais.
“Pessoas, eu nunca vi alguém tão feio em toda minha vida.”
Ela batia o recorde, ganharia sem esforço, qualquer concurso do gênero.
A pele bege, toda ruça pela falta de hidrante, o cabelo cor de burro fugido parecia esponja de aço. Os dentes desproporcionais por natureza ganharam cáries como aliadas, acessórios.
É lastimável se deparar com alguém assim.
Não era a limitação financeira que a fez desse jeito. Depois de algumas quedas na vida, perdeu a vaidade, perdeu a vontade de se olhar no espelho.
Desleixada, traja sempre roupas velhas, porém não por necessidade, é que se acostumara viver das sobras alheias.
Fora melhor assim.
Antes de se tornar extremamente feia se casou.
E hoje o marido vive nas mesmas condições dela.
São tão desprovidos de cuidado que causa pena em quem os vê.
__ Que saco – reclamava da espera da lotação. – Esses políticos tem que melhorar o transporte público, pôr mais “buzu” para gente.
Foi o fiasco para o bando de menos favorecidos começarem a reclamar.
__ Saí de casa às cinco da manhã.
__ Eu venho e volto em pé, meus pés incham tanto – ressaltou uma senhora mostrando o pé.
__ Eu vou pro final, lá consigo sentar – disse uma empregada doméstica com cara de quem comeu e não gostou.
__ Já me acostumei.
__ Se eles pegassem ônibus, iam entender o que passamos – referiu-se aos parlamentares.
__ Eles andam é de carrão – um jovem não deixou de opinar.
__ Nós que pagamos tudo – interveio outra pessoa sofrida.
__ Vou financiar um carro, nem que seja usado.
__ Eu também.
__ Primeiro tenho que terminar o carnê da geladeira, comprei uma frost free.
__ Eu comprei um notebook em doze vezes.
E enquanto revelavam com orgulho suas conquistas, a fila aumentava depressa.
Todos os dias a mesma coisa, entre dezessete e dezenove horas, os trabalhadores aglomeram nas filas intermináveis à espera da condução que os levará de volta ao lar.
Quando o ônibus chega o empurra-empurra é certo.
E vão entrando, entrando, se espremendo e muitos ficam pendurados na porta.
É um inferno.
Ônibus cheios o tempo todo, em dias de calor o odor dos vencidos tomam o ambiente, em dia de chuva a coisa fica mais complicada, pois todos fecham as janelas.
Andar de lotação nesses horários é o mesmo que comer o pão que o diabo amassou com o rabo.
Como alternativa tem o metrô, mas a situação é pior ainda.
O jeito é ir vivendo um dia após o outro com a ilusória esperança de que o amanhã será melhor.
Ah, a feia empurrou, empurrou e achou um lugar para se sentar, melhor assim, pelo menos sobrou uma vaga a mais no ônibus.

 

 

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