As Belo-horizontinas

A usada do Centro

O Centro de Belo Horizonte, também denominado Hipercentro, é um bairro planejado, localizado na região central da cidade.
Foi projetado para que as avenidas se cruzavam na diagonal, ao invés do clássico xadrez das grandes cidades da época. Projeto com um olhar no futuro, em que avenidas e ruas eram mais largas que as convencionais.
Em 2002, seguindo uma tendência mundial, a prefeitura lançou o plano de revitalização do Centro. Muitas praças e pontos turísticos do Centro ganharam uma nova modelagem.
Em um bordel que ultrapassara as décadas vive Luana, esposa da vida. Impetuosa. No seu quarto simples passa todos os dias, muitos homens, que saem realizados.
A labuta começa por volta da onze da manhã.
__ Os casados adoram vir na hora do almoço. – dizia a experiente.
E tinha razão, logo o sobe e desce nas escadas do prazer começava.
Homens de todas as idades.
Homens de todas as classes sociais.
Homens bonitos e feios.
Homens gordos e magros.
Homens gostosos e indiferentes.
Homens que sabiam muito e tantos outros que não sabiam nada.
Luana chegou ali com dezessete anos, após ouvir tantas histórias da região, a famosa zona da cidade, soube que muitas mulheres enriqueceram fazendo programas, outras tiveram a sorte de achar um coroa para sustenta-las por toda a vida.
Ela tinha uma pele bonita, lisa, sem marca alguma. Com mais de um metro e setenta, seu corpo fora bem projetado e delineado. Um perfeito corpo de mulher. Pernas torneadas. Boca sensual. Olhos sedutores. Cara de anjo. Nádegas e seios que chamavam atenção.
Menina-mulher.
Depois de assistir muitos filmes do gênero se sentiu pronta para a função.
Por sorte seu primeiro cliente tinha uma “pegada” boa. Fora enlouquecido e a enlouquecera de prazer.
Mulher de zona nunca fora respeitada, apesar de pagá-las, os clientes só a enxergavam como objeto. Tudo, muitas vezes, tinha que ser do jeito deles.
A fila andava e Luana experimentava as desilusões de sua escolha.
Dias.
Semanas.
Meses.
Anos.
Fora tocada e usada por todo tipo masculino. Submeteu-se a situações de extremas humilhações, mas também fora mexida no coração.
Eduardo chegou tímido com cara de menino que fazia coisa errada, com dezenove anos, tinha a beleza e fugacidade dessa fase da vida. Pele clara, braços fortes, barriga definida, pernas sensuais, olhos mel, cabelos castanhos, ondulados, bem cortados. Pés e mãos bem cuidados e outros exageros.
Foi tão quente o ocorrido nesse encontro.
E toda semana no mesmo dia, quinta-feira, no mesmo horário, onze da manhã em ponto ele já a esperava na porta do quarto. Isso para ser o primeiro, pegar sua amada limpa, sem digitais alheias.
Apreciava sem gosto algum o ambiente, desde a subida da escada fotografara tudo.
O corrimão descascado por tantas mãos que nele passavam, como o corpo das que estavam ali há tanto tempo.
O chão mal limpo.
As paredes desbotadas.
O cheiro sujo no ar.
O quarto de Luana não era muito diferente, no meio do recinto uma cama feita de alvenaria com um colchão de fina espuma, o lençol puído, as tolhas ressecadas, uma cortina escura deixava tudo a meia luz. Em frente a cama uma penteadeira antiga. Vários frascos de perfumes, embora em ambiente simples, ela tinha bom gosto e recebia diversos perfumes importados.
No criado de madeira velha, ao lado da cama, um rolo de papel higiênico barato e pequenos sabonetes em embalagens sem rótulos.
Preservativos.
A gaveta com a renda do dia, ah, metade era do dono puteiro.
Na semana seguinte, após o primeiro encontro, Eduardo voltara.
Voltou sempre. Era uma necessidade sem medida.
Abraçou-a com carinho.
__ Vamos logo – disse ela secamente, querendo evitar contato.
__ Eu pago por duas horas. Mas deixa eu te sentir.
E a beijou por todo o corpo. Aquela pele lhe fazia delirar. Um sonho bom. Algo que tira a paz.
Foi beijando-a, beijando-a até sentir o cheiro de menta vindo sua boca, face a face.
__ Eu não beijo – foi rude.
__ Porque me evita? Me beija… eu pago o dobro.
__ Não se beija uma puta.
__ Para mim não é uma puta.
Luana já ouvira dizer inúmeras vezes que puta não pode beijar porque se apaixona. Não queria arriscar. Não poderia arriscar. Aquele garoto a incomodava. Deixava-a insana e perdida em tantas vontades. Certamente ele não poderia resgatá-la dali. Era muito novo ainda.
Luana não o beijou. Apenas o abraçou.
Conversaram nos braços um do outro.
Ele falou sobre a sua vida.
Ela não tinha o que falar.
Sabia da sua realidade, sabia que apesar de tanta beleza era simplesmente uma vendedora de sexo, vendedora de prazer, a usada. Pagavam-na para isso.
Era paga para ser usada.
Todavia o amor possuíra os dois.
Luana não conseguia mais disfarçar.
E cedera ao beijo. Cedera ao desejo do seu coração ferido.

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